Tag: poesia

  • Caderninho verde

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    por: Carmen Capra

    * caderninho verde 2/4/2020

    2/4/2020
    passei a mão no rosto de pele lisa e macia como nunca ou nunca
    passei a mão no rosto

    3/4/2020
    um punhado de perfume
    jasmim estrela

    4/4/2020
    a maçã gala tem 4 sementes
    às vezes
    uma é seca

    eu fui lá fora e vi dois sóis
    sem explicação

    5/4/2020
    não veja eu
    olha
    o que digo

    o diálogo cortez
    tem na cortesia o que corta
    o dizer da palavra

    6/4/2020
    o pingo da chuva
    só existe sozinho pela algerosa
    da vizinha

    gargalhada de criança, pipoca estourando, live com parente aos gritos, cortina bordô aberta,
    chão de parquet, homem fazendo apoios
    vistas das janelas vizinhas

    2020 a cada vez é um número difícil ser escrito

    10/4/2020
    quando a cordialidade reveste a indiferença e a hostilidade?

    Vazer
    (va.zer)

    v.

    vazia, pretérito imperfeito do verbo vazer

    13/4/2020
    acordar sem sobressalto
    desligar os 4 alarmes
    mexer nas cortinas
    fazer fotos às 10 da manhã
    olhar as unhas das mãos e dos pés, os pelos das pernas
    saber as quantidades de comida
    esquecer de
    dormir quando se dorme

    21/4/2020
    perdi várias ideias
    cortando couve fininha, sinto a testa contraída. pinguei o vinagre e misturei com os dedos.
    sorri. pinguei o azeite e misturei com sorriso. viva.

    sem marcadores do tempo, encontrar outros

    trabalhar cansa, já disse o Pavese

    4/5/2020
    7 ½ andar

    futuro no presente
    a planta na semente,
    colher na semente do caqui

    5/5/2020
    a distopia, nas séries, vem por partículas no ar
    flocos
    a contaminação invisível,
    polvilhada

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  • Ressonâncias

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    por Marcelo Jungmann Pinto


    Posicione o seu fone, é Lua nova. Começar novo, de novo.
    No contrafluxo de veículos automotorizados um corpo-peregum caminha entre as árvores e procura afinar-se com o arco ancestral.

    – Escuta! O que é que ressoa?
    – É um corpo sonoro.
    – Mas qual? Uma corda, um metal, ou o meu próprio corpo?
    – Escuta: é um arame esticado entre uma câmara de ressoar mundo e um pedaço de pau, e que um outro golpeia, fazendo-te ressoar segundo o teu timbre e ao seu ritmo.

    fotos: Pierre Verger, Bahia 1940