Category: sociologiaeducacao

  • Investigações sobre a experiência escolar

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    Para quem perdeu o primeiro encontro ou está chegando agora no curso recomendo que comece por aqui para se situar: https://pt.wikiversity.org/wiki/Sociologia_da_Educação_na_Pandemia_Covid-19

    Leia também essas breves reflexões que escrevi apresentando o espírito do percurso do semestre:
    [1] Sociologia da Educação na Pandemia Covid-19 – experimentar presença: https://www.tramadora.net/2020/07/18/sociologia-da-educacao-na-pandemia-covid-19-experimentar-presenca/
    [2] Retomar o Per-curso: https://www.tramadora.net/2020/08/02/retomar-o-per-curso/

    Agora no início do curso serei um pouco redundante nas explicações. Como estamos lidando com muitas novidades nesse processo e acho importante criarmos um solo comum de entendimento da proposta.

    O conteúdo teórico do semestre está organizado em ciclos quinzenais temáticos.
    Teremos 5 tópicos distribuídos em 10 encontros. Toda semana há sempre alguma leitura básica indicada e textos complementares sugeridos. Em um ciclo quinzenal teremos, portanto, um primeiro encontro entre nós pra conversamos sobre textos, discutir, pensar em possíveis produções/criações. No segundo encontro, na semana seguinte, teremos uma aula ampliada (momento expositivo, apresentação de convidadxs, debates, etc).

    Neste primeiro ciclo nosso tema central é \”instituição escolar\”.

    Nesta semana, dia 12/8, estarei disponível pra encontra-lxs e poderemos conversar/discutir sobre os textos indicados; mas também refletir, imaginar e experimentar produções (coisas que podemos criar) que estejam relacionadas à temática \”instituição escolar\”.

    Na próxima semana, dia 19/8, teremos um encontro em que vamos explorar os conteúdos mobilizados pelas leituras indicadas para a quinzena (principalmente a bibliografia básica, mas também dialogando com a literatura complementar). Também queremos transbordar a discussão para além dxs autores/textos. Os textos serão disparadores da nossa reflexão sobre as relações entre o tema \”instituição escolar\” e a linha que articula nosso semestre: \”educação em tempos de pandemia\”.

    Também esperamos que até o dia 19/8 possamos fazer circular entre nós (através do grupo no Telegram ou postando um comentário no próprio site) algumas criações próprias ou materiais que vocês estejam coletando e que estejam relacionadas ao nosso curso. Neste link, por exemplo, vocês podem ver uma coleção de matérias que estou organizando: https://pt.wikiversity.org/wiki/Sociologia_da_Educa%C3%A7%C3%A3o_na_Pandemia_Covid-19#Links_selecionados:_Educa%C3%A7ao_em_tempos_de_pandemia

    Mas o que exatamente podemos criar, narrar? Vou dar algumas pistas pra cada um criar um rastro!

    O campo da sociologia da educação investiga e problematiza a instituição escolar e os processos educacionais sobre diferentes perspectivas. A escola, a maneira como ela organiza os processos educacionais, os seus efeitos, as diferentes concepções sobre os objetivos e os sentidos da educação, as concepções e os modos de subjetivação sobre o que é ser alunx ou professor, as formas de organização do trabalho…são alguns dos possíveis eixos de investigação sociológica ou antropológica sobre o fenômeno educativo.

    No contexto da pandemia Covid-19 há muitos processos de transformação em disputa no campo educacional. Nas situações de crise conseguimos, às vezes, visualizar processos que já estavam ocorrendo e que agora se tornam mais agudos e visíveis. É no momento de suspensão do cotidiano, que o \”normal\” e o \”natural\” de nossas rotinas educacionais se revelam como construções sociohistóricas minuciosas.

    Nós professorxs e estudantes no ensino superior, estamos experienciando muitas situações e também acompanhando discussões, conflitos e reconfigurações sobre a educação.

    O que você gostaria de narrar (com um micro-video, fotos, um pequeno ensaio, uma poesia ou uma música…) sobre a sua experiência com relação à educação na pandemia? De que maneira a situação pandêmica cria situações que fazem com que você sinta, perceba e analise de forma diferente algum aspecto ou dimensão da sua experiência na educação universitária?

    Vou compartilhar minha experiência: desde que foi definido que os cursos desse semestre seriam oferecidos de forma remota uma das questões que não pára de me atravessar é: o que pode ser uma aula? Ter que realizar uma aula em condições muito distintas me obriga a pensar sobre o que pode ser uma aula e todos os elementos que a caracterizam na minha experiência docente. Quando realizamos uma aula há uma certa concepção sobre o que é produção-transmissão de conhecimento; sobre quais os recursos, técnicas e métodos que podem ser mobilizados, sobre quais são as expectativas sobre as performances de estudantes e professores; sobre o sentidos da presença em sala, etc. Neste movimento e sendo forçado a lidar com uma nova realidade, passo a refletir sobre alguns aspectos constitutivos do ambiente universitário e outras perguntas surgem: o que é presença? como criar um encontro? como devemos lidar com o conteúdo/currículo prescrito? como criar um percurso coletivo? Como criar dinâmicas de produção coletiva de conhecimento que evitem os mecanismos de individualização da aprendizagem? Uma aula gravada é uma aula?

    Preparando o curso deste semestre, não paro de me surpreender com os achados na rede. Procurando o pdf de um texto do Basil Bernstein, trombei com essa exposição gravada (acho que é um projeto experimental) com o texto do Bersntein. Uma leitura feita com \”inteligência\” e voz artificial: https://www.youtube.com/watch?v=yQkZEPCKBpQ

    Agora, se um algoritmo pode fazer a leitura de um texto qualquer e se esse conteúdo pode ficar amplamente disponível como uma \”aula\”, isso nos obriga a pensar sobre o que é próprio ou específico de uma experiência de aula. O que acontece numa aula?

    Essas e outras perguntas me desafiam a investigar as práticas constituídas e ao mesmo a tentar inventar outras. Durante esse semestre, vou insistir em ficar com esse problema: \”o que pode ser uma aula?\”

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  • RetomaR o per-curso

    A palavra experiência vem do latim
    experiri, provar (experimentar). A experiência é em
    primeiro lugar um encontro ou uma relação com algo
    que se experimenta, que se prova. O radical é periri,
    que se encontra também em periculum, perigo.

    A raiz indo-européia é per, com a qual se relaciona antes de
    tudo a idéia de travessia. Em grego há numerosos derivados dessa raiz
    que marcam a travessia, o percorrido, a passagem:
    peirô, atravessar; pera, mais além; peraô, passar atra-
    vés, perainô, ir até o fim; peras, limite. Em nossas
    línguas há uma bela palavra que tem esse per grego
    de travessia: a palavra peiratês, pirata
    . (J.Larrosa)

    Iniciamos o curso Sociologia da Educação (Unifesp) na primeira semana de março. Lembro-me de conversar com os estudantes sobre as incertezas que se apresentavam diante de nós e os rumos do semestre. A pandemia covid-19 ainda era um problema que não havia nos atingido e as preocupações imediatas estavam mais concentradas nos ataques à universidade publica, nos cortes no financiamento da ciência e educação e na paralisação indicada para o dia 18 de março. Lembro-me de falar com xs estudantes que apesar das incertezas seriamos capazes de concluir o semestre. Incrível pensar em tudo que aconteceu desde então. Sinto que nossas vidas já não são as mesmas, o planeta já não é o mesmo. Então, como seguir com o mesmo curso?

    Na primeira aula do curso, antes da interrupção, lancei uma reflexão inicial sobre a relação Educação e Sociedade, inspirada em algumas colocações do Ailton Krenak em sua conferência realizada em Salvador no final de janeiro de 2020. Como imaginar que aquela reflexão sobre \”Como Adiar o Fim do Mundo?\” se tornaria tão urgente e amplamente difundida nesse mesmo ano? Há mais de 500 anos enfrentando o fim do mundo, os povos indígenas são os maiores especialistas no assunto, e já faz muitos anos que nos alertam sobre o fim de um mundo tal qual o conhecemos.

    Não poderia retomar o curso, no meio da maior pandemia que já vivemos, sem voltar àqueles palavras do Ailton Krenak. Sinto que já não podemos adiar algumas reflexões e conversas francas. Há um trecho naquela palestra de Salvador que o Ailton comenta sobre a educação das crianças. Recomendo a escuta deste fragmento de 11 minutos (2:15:00 – 2:26:00): https://www.facebook.com/watch/?v=119400642687358

    Esse pequeno trecho inspira alguns argumentos que reorganizam o per-curso da disciplina Sociologia da Educação na Pandemia Covid-19 em 2020.

    1. O fenômeno educacional é o processo pela qual um determinado coletivo introduz um outro grupo de pessoas (geralmente mais novas) num mundo que lhe antecede ou que lhe é estrangeiro. Mas toda processo educacional é também a fabricação de um mundo.
    2. As causas da Pandemia Covid-19 evidenciam a relação que insistimos em negar entre o modo de vida da nossa civilização (branca, ocidental, racista, heteropatriarcal, antropocêntrica, extrativista, capitalista…) e a emergência das novas crises socioambientais, zoonoses na escala planetária e mudanças climáticas irreversíveis.
    3. Nossa educação (em termos socioculturais e epistêmicos) produz genericamente uma forma de vida não consequente, não implicada, não responsável pelos seus efeitos no mundo. Temos dificuldade em reconhecer e assumir coletivamente as relações de causalidade entre nosso modo de vida e os problemas que estamos produzindo. Ademais, abunda em nossa sociedade uma vasta indiferença pelo sofrimento e pela vida do outro.
    4. Do ponto de vista educacional devemos reconhecer, portanto, que aquilo que é ensinado às crianças sobre o nosso mundo é uma farsa. O quê e como ensinar? Como reproduzir um modo de vida que coloca em risco sua própria existência no planeta? É essa a constatação do Ailton Krenak ao narrar a luta socioambiental do movimento internacional de crianças e jovens. Elas estão dizendo que nossos governos não cumprem seus compromissos, que os adultos não assumem a responsabilidade pelo futuro do mundo em que as crianças viverão, e os empresários não se interessam pela sustentação da vida intergeracional.

    O campo da Sociologia da Educação tem como principal centro problemático a relação entre a reprodução e a mudança social: em que medida e sob que condições (processos, instituições, culturas, políticas, classes etc) o fenômeno educacional reproduz a sociedade que o engrenda e/ou cria possibilidades de mudanças. No percurso dessa disciplina pretendemos olhar para essa tensão sob alguns recortes específicos. Porém, sempre partindo dessa constatação desagradável e urgente. Não podemos mais adiar as perguntas difíceis. Desejamos habitar o acontecimento covid-19 naquilo que ele nos inspira a nos responsabilizarmos pelo mundo que criamos. Como pensar a educação numa perspectiva crítica e para além do antropoceno/capitaloceno? Como imaginar e criar outras mundos que escapem da \”nova normalidade\” que guarda outras pandemias porvir?

    Sobre o curso (início 5 de agosto): vespertino 15hs; noturmo 19hs.

    Programa e recursos: https://pt.wikiversity.org/wiki/Sociologia_da_Educa%C3%A7%C3%A3o_na_Pandemia_Covid-19

    Canal de difusão no Telegram: https://t.me/socioeduca2020